sábado, setembro 1

Portugal Público: um jogo em prolongamento

Claustrofóbico e sufocado: era como vivia Portugal - e a senhora da imagem que poderia muito bem ser a minha avó - para lá dos 38 anos passados (verdade, foi em 1974 que se cravou a Liberdade em terras lusas). A eficácia da Máquina evaporizava qualquer tentativa de manifestação de liberdades individuais ou colectivas, sendo que os ataques da censura mutilavam a troca de ideias e impediam as relações sociais. Espaço Público? Absolutamente condenado. Os resultados da acção invisível da Máquina eram totais, enfim, uma sociedade completamente fechada, anestesiada e adormecida.

Esta é a fotografia que adquiri do meu país através dos longos e perturbadores monólogos dos meus professores de História, sempre naquele tom monocórdico, trágico, sem volta a dar. Mas voltando as páginas ao presente, sem voltar as costas ao Passado, o que é hoje o Espaço Público Português?

Eu diria que a Máquina é outra mas a música é a mesma: de facto, parece que expulsamos toda a parte da História que não era desejada porque poderia regressar de um nevoeiro, assombrando o «Novo Estado» que se avizinhava; pois assim se fez e apenas fora expulsa parte da História, como por exemplo, substituir o nome da ponte sobre o Tejo (se calhar porque alguém poderia mesmo emergir do nevoeiro e condenar Portugal mais 40 anos). O que não fizemos foi eliminar a doença contagiante, hoje crónica, de continuar instalados fora do que realmente acontece no nosso território.

Respondendo à questão: na minha óptica, o Espaço Público Português encontra-se, ainda, em stand-by. Por inércia do povo? Também. Mas existe mais: um espaço artificial criado em televisão de debate ideológico, político e partidário que existe por necessidade da esfera política em manter sustentável as barreiras impenetráveis contra o pensamento criativo; esse circuito mediatizado está normalizado, pautado com regras, abolindo as intervenções energéticas e fulgurantes dos participantes, e as opiniões desses políticos são opiniões superficiais, não de políticos mas de comentadores. Limitam-se a comentar, a discursar sobre isto e aquilo que se passa nesse circuito fechado, ao qual o povo mal consegue aceder não por incapacidade mas por insuficiência de portas abertas: programas com participação telefónica? São foruns controlados pelas entidades, orientados por pseudo-políticos que comentam o discurso de um político que já havia comentado o discurso de outro político.

Trata-se de um circuito fechado e com mecanismos personalizados, ocultos e capazes de esquematizar todas as suas esferas, exercendo relações de poder e outro tipo de pressões para seu próprio bem. O que haveria de ser deste circuito se desse oportunidade ao real Espaço Público? Certamente, um eclipse. Destruição era o seu caminho, uma vez que a sua democratização acabaria por romper a mecânica da obediência televisiva, onde o telespectador é o ouvinte e a sua opinião é a opinião pré-fabricada, um constructo falso, não-dedutivo, não-experimentado; o telespectador é obediente, cala e ouve, pertence a uma massa esfomeada por imagens e pelas afirmações dos políticos e consequentes re-afirmações dos comentadores.

Um real Espaço Público é o contacto próximo, minimamente mediado e universalmente aberto, com as devidas explicações, sem sermões. A Política em Portugal é «fraca» ou «chata» porque ninguém a percebe. Ninguém a percebe porque se fecha.

E dizia eu: passaram 38 anos desde a Revolução dos Cravos?

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